domingo, 12 de abril de 2009

Infecção Puerperal


 

Conceito- É a infecção que se localiza nos órgãos genitais e que ocorre após o parto ou abortamento recentes, caracterizada por febre de 38ºC que ocorre em 2 dos  10 primeiros dias pós-parto, excluindo as 24 h iniciais, em tomadas feitas sublingual, 4 vezes ao dia..

Infecções urinarias, pulmonares e mamarias podem ocorrer no puerperio recente, com quadro febril similar ao da infecção puerperal, caracterizando o quadro clinico de morbidade febril puerperal. Assim sendo devemos excluir outras patologias febris presentes no puerperio antes de afirmar tratar-se de infecção puerperal.

 

IncidênciaA tríade letal do ciclo gravidico- puerperal é infecção puerperal (1% a 10%), síndromes hemorrágicas (0.4% a 10%) e síndromes hipertensivas (30%). A IP vem cedendo lugar as síndromes hipertensivas e equilibrando com as síndromes hemorrágicas.

 

Etiopatologia-

Causas predisponentes:

·        Parto cesariana – 20%

·        Ruptura prematura das membranas – 21%

·        Parto vaginal prolongado e traumático –7.7%

·        Hemorragia ante, intra e pós-parto

·        Placentação baixa

·        Condições socioeconômicas

·        Atividade sexual

·        Retenção de restos ovulares

·        Circlagem

·        Monitorizaçào interna

·        Idade materna

·        Gemelaridade

Na cesárea, as condições que agravam o prognostico da mãe são: cesáreas eletivas complicadas, com maior volume hemorrágico; tardias, após partos prolongados e muito manuseados; com amniorexe prolongada e complicação de infecção materna; com apresentação fetal profundamente insinuada obrigando a manipulações, contaminação e a irritação da cavidade peritonial por liquido amniótico infectado e complicações técnicas- lesões de alças, de bexiga, do ceco-. A  infecção endometrial é a mais freqüente, devida entre outras causas a maior manipulação endouterina, a presença de fios de sutura, a necrose isquêmica da cicatriz miometrial, os hematomas locais e o derrame de liquido amniótico na cavidade peritonial (irritação mais infecção).

 Na ruptura prematura das membranas, após 12 horas, a cultura do material amniótico mostra-se positiva para as bactérias da flora do canal cervicovaginal, principalmente porque as contrações uterinas favorecem a aspiração intrauterina do material cervicovaginal, que é o contaminante.

Manipulações repetidas no canal do parto, ié, os toques repetidos e as manobras intra cavitários (curetagem pós-parto, descolamento manual da placenta), elevam os índices de IP. Condições agravantes são as manobras dilatadoras do colo e a extração incompleta dos anexos ovulares. O material trofoblástico é um ótimo meio de cultura.

No parto prolongado, quando ocorre um maior intervalo entre a ruptura da bolsa e o parto e a compressão dos tecidos maternos pela cabeça fetal seguida de mortificação dos tecidos locais favorece a multiplicação bacteriana local.

Hemorragia ante, intra e pós-parto levando a anemia com redução da resistência antiinfecciosa.

Placentação baixa, que é a presença de tecido trofoblástico deslocado nas proximidades do canal cervical.

Condições socioeconômicas, com o estado civil não definido que tem como conseqüência um maior numero de parceiros sexuais, elevando o índice de infecções cervicovaginais, hipoproteinemia devido o estado nutricional e pode ocorrer amniorexe prematura, devido o trabalho em posição ortostáticas. 

Quanto à idade materna, em adolescente é mais freqüente a infecção endometrial pós-cesaria do que em pacientes mais idosa (44%:15%), talvez devido o comportamento sexual.A atividade sexual em gestação avançada, principalmente em multíparas onde o colo é mais permeável.

Retenção de restos ovulares em extrações placentárias incompletas em partos mal assistidos.

Circlagem tem maior incidência de endometrite em pós-cesárea.

Gemelaridade resolvidas por cesáreas tem maior índice de endometrite e de infecção da parede abdominal devido principalmente ao estado nutricional e a maior hemorragia de dequitação.

 

Bacteriologia:

Geralmente a IP é polimicrobiana. São na grande maioria da flora intestinal e que freqüentemente colonizam períneo, vagina e cérvice.

 

 

 

 

Principais bactérias envolvidas na infecção puerperal

Aeróbios                                                     Anaeróbios

Gram positivos                                         Gram positivos

 

Estreptococos β hemolítico do grupo A                Cocos anaeróbicos

S.pyogenes                                                         Peptococcus, Peptostreptococcus

 

Estreptococos β hemolítico do grupo B                 Bacilos anaeróbicos

S.agalactieS.mastidistis            C.perfringes, C.welchi

 

Enterococos

S.faecalis, S.faecium

 

Estafilococos

S.aureus,S.epidermidis

 

Gram negativos                                        Gram negativos

 

Enterobacterias                                                      Bacilos anaeróbicos

E.colo,Klebsiella                   B.fragilis, B.bivius

Enterobacter,Proteus               Fusobacterium

 

Pseudomonas

Haemophilus influenzae

Gardnerella vaginalis

Outros

Mycoplasma hominis

Chlamydia trachomatis

 

Formas Clínicas: localizada de inicio, pode se propagar (continuidade, linfático e venoso) e até generalizar, assumindo gravidade prognostica paralela a invasibilidade e a agressividade microbiana.

 

Localizada

Propagada

Generalizada

Vulvoperineal

Miofascites

Endomiometrite

Peritonite

Vaginite

Salpingite

Septicopioemia

Cervicite

Anexite

Septicopiomia

Endometrite

Parede abdominal

Parametrite

Pelviperitonite

Tromboflebite pélvica

Choque séptico

 

Vulvoperineal- Lacerações ou ipisiotomia amplas que invadem a fossa isquiorretal. Nesses casos a execução de ipisiorrafia nem sempre segue com hemostasia perfeita e assim favorece a ocorrência de abscesso local.

O quadro clínico é caracterizado por dor, edema, tumefação local, hipertermia vesperal, defecação e deambulação dolorosas e sensação de estiramento dos fios localizados no períneo e muitos dor ao toque.

 

Vaginite e Cervicite- Devido à mucosa vaginal traumatizada e  a cérvix uterina com lesões necróticas (cervicodilatação incompleta com apresentação cefálica insinuada) juntamente com a flora polimicrobiana.

Quadro clínico- Pobre em sintomas, exteriorizado por abundante secreção seropurulenta e excepcionalmente por temperatura subfebril.

 

Endometrite- É a forma mais freqüente de infecção puerperal, tem relação direta com cesáreas e intervenções vaginais após partos prolongados, amniorexe prolongado e com  muita manipulação intravaginal e intra-útero.

Quadro clinico é caracterizado pela tríade: Subinvolução,dor a palpação e amolecimento corporal. A temperatura oscila entre 37.5 e 38. a loquiação pode ser inodora se for por estreptococos ß hemolítico do grupo A, fecalóide se for por enterococos, E.coli, Bacteróides fragilis.

As manifestações mais precoces ocorrem quando a etiologia for pelos estreptococos hemolítico do grupo B e as mais tardias quando for porChamydia trachomatis, nesta etiologia o quadro clínico ocorre após a alta hospitalar.

 

Parede abdominal- Mais freqüente nas obesas, na incisão de Pfannestiel, nos partos prolongados com manuseio grande. Na sua etiologia interfere, particularmente a deficiência de hemostasia e o conseqüente hematoma subaponeurótico e/ou do tecido celular subcutâneo.

 

Miofascites- São raras, São as infecções da área vaginoperineal que se propagam e atingem os músculos e as fáscias proximais.

Quadro clínico é caracterizado por dor local, calafrios e hipertermia, podem ocorrer necrose dos tecidos envolvidos. Crises repetidas de calafrios sugerem a invasão de germes na circulação da puerpera, pode evoluir para o choque séptico.

 

Endomiometrite- Invasão microbiana do miométrio (microabscessos), é uma complicação da endometrite. A tríade uterina (subinvolução, dor a palpação, amolecimento corporal) assume aspecto mais intenso e surgem crises repetidas de calafrios, hipertermia elevada e persistente . O estado geral fica comprometido e pode evoluir para choque séptico. A loquiação abundante, espumosa e fétida (a microbiana anaeróbica), ou escassa e inodora (estreptococo aeróbio do grupo A). Incidência mais freqüentemente em cesáreas, partos prolongados, amniorexe longa e toques vaginais numerosos. 

 

Salpingite-Anexite- Infecção das tubas e do ovário. Ocorrem  em geral após praticas abortivas e conseqüente infecção. Levam a  complicações da endomiometrite e com freqüência se associam a quadros de pelviperitonite.

Na fase inicial, atinge a mucosa e a muscular tubária (endomiossalpingite) e pelas vias venosas, linfáticas ou por continuidade, estende-se aos ovários e peritônio pélvico.

Constitui-se em bloco, sob forma de abscesso , a rotura do abscesso segue-se de um quadro de peritonite que com freqüência se complica com choque séptico.

O quadro clinico geral é de taquicardia, hipertermia do tipo supurativo e taquipneia. O local é dor em baixo ventre, que se exacerba com a palpação profunda e com a descompressão brusca, dor aguda a mobilização uterina, sinal de Proust- dor ao tocar o fundo de saco.

A ruptura do abscesso piora o prognostico materno, e se manifesta por dor aguda e súbita acompanhada de náuseas, vômitos e vertigem, queda de pressão arterial, sudorese, agitação e pode chegar ao choque. Na punção de Douglas pode aspirar pus, radiografia do abdome identifica pneumoperitônio.

 

ParametritePode ser dos parâmetros anterior e posterior, mas freqüentemente é do parâmetro lateral e unilateral. Ocorre devido a lesões cervicais extensas e vaginais que favorecem a invasão microbiana do tecido conjuntivo fibroareolar parametrial. Por disseminação linfática, o processo infeccioso pode se estender entre os folhetos do ligamento largo, constituindo abscessos e flemões com localização alta, baixa e mista.

No quadro clinico, o útero encontra-se deslocado para o lado oposto ao processo supurativo e a sua mobilização -difícil e parcimoniosa- provoca dor intensa. Quando se propaga para o espaço vesicouterino (P. anterior) ou para traz (P. posterior) pode ocorrer, respectivamente, sintomas urinários- Polaciúria, retenção urinaria- e retais- tenesmo e dificuldade defecatoria-. Pode ser um processo infeccioso global, ié, todo o ligamento largo

A US, TC e a RM são indispensáveis para o seu diagnostico topográfico.

 

Peritonite- A infecção puerperal pode se limitar ao peritônio pélvico (pelviperotonite) ou estender-se a toda cavidade abdominal (peritonite generalizada). Ocorre em partos prolongados, muito manuseados, amniorexe prematura, tentativa frusta de intervenção vaginal.

Ao quadro clinico, observa-se febre alta (40ºC), dor abdominal a descompressão brusca (sinal de Blumberg), evidenciando irritação peritonial, íleo adinamico, sinal de Proust. A queixa dolorosa espontânea, de inicio localizada no baixo ventre, irradia-se para todo abdome. A inspeção a fácie hipocrática- olhos côncavos, nariz afilado e aspecto angustiado-, a língua seca, tendência à posição semi-sentada- reduz a dor-, ocorrência eventual de soluços- irritação frênica-. Náuseas e vômitos provocados pelo antiperistaltismo dos segmentos intestinais, agravados pela sudorese profusa, isto leva a desidratação -hemoconcentração- e alterações metabólicas- hipocalemia, hipocloremia e acidose-.

A gasometria pode identificar queda da pO2 e PH (acidose e hipoxia), elevação da pCO2. Nos casos complicados leva ao choque séptico. Na complicação pode chegar ao empiema.

 

Tromboflebite Pélvica- No puerperio mediato, após partos normais, após partos  vaginais traumáticos e operações cesáreas segmentares com incisão transversa propagada, não são infrequentes complicações venosas profundas (veias dos membros inferiores e da região pélvica) caracterizadas pela ocorrência de tromboses, com ou sem infecção.

 A responsabilidade do estado puerperal na incidência da TVP é devido à tríade que se relaciona a esta patologia (lesão do endotélio, redução da velocidade do fluxo circulante, alterações sanguínea). Ocorre a elevação dos fatores de coagulação, do fibrinogênio, criando-se estado de hipercoagulação, agravado no puerperio febril devido a hemoconcentração, e também a presença de inibidores da fibrinolise4, produzidos pela placenta.

Após 3 a 5 dias do parto, ocorrem a hipertermia escalonaste, taquiesfigmia inexplicável e queixas vagas (mal estar, inquietação, angustia) que não tem resolução com a terapêutica antibiótica. Isto deve alertar o obstetra para a tromboflebite pélvica com ou sem migração trombótica. A remissão dos sintomas dentro de 24-36 h. após a administração da heparina, até prova em contrario, sugere esta hipótese diagnóstica. Este diagnóstico é favorecido pelos US, TC e a RM, cuja realização esbarra na complexidade e nos custos.

 A embolização trombótica fica patente quando atinge rins (dor localizada na loja renal e hematúria); cérebro por queixas neurológicas e às vezes por quadro convulsivo, e a mais freqüente , a pulmonar com a redução do fluxo sanguíneo ao coração esquerdo e assim queda do debito cardíaco,aumento da pressão pulmonar, necrose hemorrágica na área pulmonar atingida, depressão da função pulmonar. (dispnéia súbita, dor torácica e hemoptise, com evidente queda da pO2 e até choque cardiogênico e morte materna).

 

Choque sépticoFebre alta continua (40ºC) associada a calafrios, taquicardia, hipotensão e confusão mental. A flora microbiana mais encontrada nesses casos, é representada por E. coli, bacteróides e clostridios.  

 

Exames Laboratoriais

·        Hemograma

·        Hemocultura – deve se colher o material antes de começar a antibioticoterapia.

·        Urocultura- pode ocorrer a bacteruria assintomática por enterobacteria  que pode indicar a participação deste microorganismo na infecção puerperal.

·        US- é fundamental no diagnostico de retenção de restos ovulares, abscessos e hematomas intracavitarios e de parede abdominal.

 

Tratamento

Baseia-se na antibioticoterapia assim que o diagnostico tenha sido estabelecido e os materiais para cultura colhidos.

Como a infecção é polimicrobiana, com bactérias aeróbicas e anaeróbicas proveniente da flora intestinal e genital a terapêutica antibiótica deve ser abrangente.

As combinações mais comuns utilizadas são:

1-           Ampicilina ou penicilina associada a aminoglicosideo ( gentamicina ou amicacina) e metronidazol

2-           Clindamicina em associação com aminoglicosideo.

 

Em pacientes com função renal comprometida pode substituir o aminoglicosideo por cefalosporina de terceira geração (ceftriaxona) ou por aztreonam.

O esquema 1 é ineficaz contra estafilococos produtores de penicilase, neste caso deve se administrar medicação especifica (oxacilina, clindamicina ou vancomicina), na dependência do antiobiograma ou gravidade do caso.

Contra o enterococos a combinação 2 não é efetiva, deve se associar ampicilina ou penicilina.

Em endometrite não complicada, a antiobioticoterapia parenteral deve ser administrada até a paciente tornar-se afebril ou assintomática por pelo menos 48 h., podendo a paciente ser liberada para controle ambulatorial.

 

 

Antibióticos e dosagens habituais empregados na Infecção puerperal

 

Agente                                            Dose- Intervalo/Via de administração

Ampicilina                                      1g a 2g cada6h/EV

 

Penicilina G  cristalina                   4 milhões UI cada 4h/EV

 

Gentamicina                                   1.5mg/Kg cada 8h/EV ou 3.5mg a 5mg/Kg

                                                                 Cada 24h/EV

 

Amicacina                                               7.5mg/kg cada 12h/EV

 

Aztreonam                                               2g cada 8h/EV

 

Ceftriaxona                                              1g cada 12h/EV

 

Metronidazol                                            500mg cada 8 h/EV

 

Clindamicina                                             600mg cada 6h ou 900mg cada 8h/EV

 

 

OBS:Metronidazol- atinge anaeróbicos, mas pouco atuante para Gram+ , bacilos aeróbicos Gram-.

         Aminoglicosideos- atinge bacilos aeróbios Gram-

         Penicilina- atinge cocos Gram+ aeróbios

 

Profilaxia-

Cuidados de assepsia e anti-sepsia devem ser rigorosamente obedecidos. Deve se recomendar à administração profilática de antibiótico nos casos de partos prolongados, rotura de membranas há longo tempo e submetidos a toques excessivos. Tem sido utilizado ampicilina e a cefalosporina durante o ato operatório e por mais 24-48 h., ou cloranfenicol- 2g até 48h. pós-parto.

 

 Fonte:www.medstudents.com.br/content/resumos/resumo_medstudents_20050426_01.doc -

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